Memória em Palavras: Atualidade das Proposições de Dom Helder Acerca das “Minorias Abraâmicas” (X)
Escritos acerca das Minorias Abraâmicas (aprofundamentos)
Responsabilidade decisiva de quem crê em Deus
Por Geraldo Frenkem
Quem crê em Deus carrega uma responsabilidade enorme. Se crê em um Criador e Pai, admite, de saída, que os homens, todos os homens, sem exceção, somos irmãos.
Como deixar de ter sede de servir, ver claro para servir com firmeza, decisão e não poupar esforços trabalhando por um Mundo mais justo e mais humano? Como não se reconhecer como pertencendo às Minorias Abraâmicas?
As grandes Religiões, de âmbito mundial, têm uma responsabilidade imensa na hora atual? Como, apesar da Mensagem, que trouxeram ao Mundo, permitiram que a Humanidade chegasse ao grau de egoísmo que aí está: u’a minoria, sempre mais restrita, que detém a quase totalidade dos bens da Terra, e u’a maioria, sempre mais densa, a quem só cabe migalhas? …
Agora, está havendo o fenômeno do ateísmo em massa. Mas os Dominadores
do Mundo, os Opressores do homem, quase todos, passaram pelos ritos religiosos,
frequentaram Templos, ouviram leituras sagradas e pregações. Que fizemos nós da
Mensagem que deveríamos transmitir aos Homens?
As Religiões, em geral, estão chegando a Declarações muito corajosas e
categóricas que, logicamente, levariam seus crentes e os homens de boa vontade a
providências concretas para tornar o Mundo mais habitável e mais humano. Dentro de
todas as Religiões, há Clérigos ou Leigos – em pequeno número – que, aqui ou ali, se
tornam mal vistos, mal julgados por desejarem concretizar os grandes textos e as belas
conclusões a que estão chegando nossos Congressos Religiosos.
A cúpula das Religiões e o comum dos seus membros contentam-se com textos
solenes e conclusões corajosos, mas afligem-se quando alguém torna ao pé da letra
estes textos. Parece-lhes precipitação, interpretação política, quando não marxista.
Há dentro das várias Religiões, uma dominante no sentido de os textos
sagrados serem interpretados como referentes à vida eterna, sim, mas partindo da
vida terrena. Há, em geral, desejo de superação decisiva de alienação, como, também,
propósito de interpretar o homem não como um escravo de Deus, um autômato, um
objeto, mas como co-criador, encarregado, pelo Criador e Pai, de dominar a Natureza e
completar a Criação.
Aliás, se as Religiões não marcharem, decididamente, nesta linha, os jovens lhes darão, sempre mais, as costas e partirão para o ateísmo.
Minorias Abraâmicas dentro das várias Religiões prestarão um bom serviço à
marcha da ideia de humanização do Homem e do Mundo:
- impõe-se a Mudança das estruturas da escravidão, tanto nos Países
subdesenvolvidos, como nos desenvolvidos. - descobrindo e divulgando, dentro dos textos sagrados, das respectivas crenças,
passagens que impilam o homem a superar o egoísmo; a praticar a justiça,
mesmo com sacrifício próprio; a trabalhar por um Mundo mais humano, mais
digno do Criador e do co-Criador; - criando a mística da obrigação religiosa de vencer a injustiça. Superar as estruturas de escravidão, varrer a miséria como insulto ao Criador e Pai;
- vencendo o fatalismo e despertando, de vez, o homem para assumir seu papel de dominador da natureza e continuador da obra divina da criação.
- É preciso que as Minorias Abraâmicas dentro das várias Religiões estejam alertas para não permitir que se formem ideias erradas como afirmar que as Religiões devem circunscrever-se aos Templos; que é heresia misturar humanização com pregação religiosa; que é subversão e comunismo exigir a mudança da ordem aparente que aí está e que mal encobre a injustiça estratificada, existente por todos os lados.
- Alguns leigos e alguns raros eclesiásticos, dentro de uma ou outra Religião podem, facilmente, ser apresentados como demagogos, políticos, subversivos, traidores da fé autêntica. Se Minorias Abraâmicas se levantarem por todos os recantos – com características próprias, atitudes peculiares, mas fiéis quanto ao essencial – os Poderosos, os Opressores terão que examinar muito mais a fundo a situação do Mundo.
- Convém afirmar bem o essencial a exigir, dentro da variedade de estilos e modos de pensar e dizer:
- impossível deixar mais de 80% da Humanidade à margem dos benefícios e serviços, à margem da criatividade e das decisões;
- urge libertar os filhos de Deus das várias escravidões: do pecado, sem dúvida;
- mas, também, da miséria e da fome; do desemprego, do sub-emprego, do desemprego disfarçado; da ignorância; da guerra; das endemias; do medo ….
- impõe-se a Mudança das estruturas da escravidão, tanto nos Países subdesenvolvidos, como nos desenvolvidos.
(Abertura da AJP para o plano mundial. Recife 21-22.1.1971. 186.º Circular.
Em: DOM HELDER CAMARA, Circulares Ação Justiça e Paz. Volume V –
Tomo III, p.p. 109-111. (Editora CEPE, Pernambuco, 2022)