Memória em Palavras: A Atualidade das Proposições de Dom Helder acerca das “Minorias Abraâmicas” (1)
Escritos acerca das Minorias Abraâmicas (aprofundamentos)
Força e beleza de ter uma causa a que dedicar sua vida
por Geraldo Frenken
O segredo de ser sempre jovem – mesmo quando os anos passam, deixando marcas no corpo, o segredo da serena juventude de alma é ter uma causa a que dedicar a vida.
Com 20 anos, sem sombra de ruga ou de cabelo branco, é possível ser um vencido
da vida, um pessimista, um velho! Quem pergunta a si mesmo, sem encontrar resposta
válida, o que é afinal a vida e que motivos podem ser invocados para enfrentá-la com
decisão, está com a juventude correndo risco …
Quando se fala em causa a que dedicar a vida, é óbvio que é preciso distinguir
entre causa e causa. Abraçar uma grande causa, ser-lhe fiel, sacrificar-se por ela, é
importante como acertar na escolha da vocação.
Tem havido grandes causas no correr dos tempos:
- Quando em Países como o Brasil, houve, durante séculos, a vergonha da
escravidão africana e, em dado momento, rebentou o Movimento
Abolicionista, entende-se, facilmente, a vibração dos jovens, que corriam,
alegremente, riscos, ajudando escravos a escapar para a liberdade e
promovendo todo um grande e belo movimento de opinião pública para
derrubar a estrutura da escravidão. Poetas, jornalistas, tribunos, sacerdotes –
homens e mulheres, profissões diferentes – fraternizam na luta sagrada de
querer livres todos os filhos de Deus! - Quando em Países como os da América Latina (no século XIX), da África e da
Ásia (no século XX), surgiu o movimento anti-colonialista, no sentido de obter a
independência política para todos os Povos, o Mundo percebeu que seria
inglória e inútil pretender manter a estrutura colonialista. E cada País liberto
conhece os seus heróis, seus poetas, seus polemistas, seus mártires, seus
santos.
Sem prejuízo de outras, numerosas causas, dignas de dedicação total e de
sacrifícios, podemos, com razão, dizer que existe a causa do século: completar a
libertação dos escravos sem nome e que são, hoje, 2/3 da Humanidade; completar a
independência política dos Países que conquistaram a própria soberania, encorajandoos
a obter a independência econômica, sem a qual de pouco adiantará o próprio
ingresso na ONU.
O que há de apaixonante é que, desta vez, o esforço tem de ser de todos, por
todos e para todos. É preciso esforço enorme e inteligente de conscientização das
Massas marginalizadas (tanto dos Países subdesenvolvidos, como dos Países
desenvolvidos), preparando-as para arrancar-se da situação sub-humana em que se acham, mas preparando-as, também, indispensavelmente, para que não se instalem na vida, não se aburguesem, não caiam na mentalidade que hoje condenam e da qual sofrem consequências.
Simultaneamente, é preciso esforço enorme e inteligente para conscientizar os
Privilegiados, tanto dos Países de abundância, alertando-os para as zonas de
subdesenvolvimento de seus próprios Países e para o neo-colonialismo que ajudam, consciente ou inconscientemente, a implantar no Mundo; como dos Países
subdesenvolvidos, onde são os implantadores e mantenedores do Colonialismo
interno.
A conscientização dos Privilegiados é dificílima e supõe muita virtude de quem
a vai tentar: o ideal a conseguir é verdade na caridade, força na suavidade, decisão e firmeza sem quebra de amor.
Sem trabalho sério e profundo, tanto nos Países desenvolvidos, como nos
subdesenvolvidos: - continuará a aumentar o escândalo de os ricos se tornarem sempre mais
ricos e os pobres sempre mais pobres; - tenderá a agravar-se a espiral da violência: agravando-se as injustiças,
violência-mãe de todas as violências; multiplicar-se-ão os gestos de
desespero dos Oprimidos; e tornar-se-á sempre mais tensa e dura a
reação dos Governos.
Quando Governos e Privilegiados chegarão a entender que paz verdadeira só se
conseguirá quando houver coragem de criar condições reais de justiça?
As Minorias Abraâmicas se esforçarão, ao máximo, para ter uma causa com que
encher a vida e firmarão, entre si, o pacto de adotar, em esforço conjugado e fraterno, a causa do século.
(Abertura da AJP para o plano mundial. Recife 21-22.1.1971. 186.º Circular.
Em: DOM HELDER CAMARA, Circulares Ação Justiça e Paz. Volume V –
Tomo III, p.p. 67-69. (Editora CEPE, Pernambuco, 2022)
Caracterização de quem deseja fazer parte das Minorias
Abraâmicas:
? “Completar a libertação dos escravos sem nome e que são, hoje, 2/3 da Humanidade”: quais são as causas e formas mais marcantes de escravidão que 2/3 da Humanidade é obrigada a viver, hoje? E as nossas atitudes diante desta histórica e gigantesca problemática