Causos do Dom: Seminarista Helder apoia a educação para o diálogo
Ivanir Antonio Rampon,
Pouco antes da ordenação sacerdotal, ao saber que fora aceito para a tonsura, Helder pediu ao reitor Pe. Tobias Dequidt para ingressar na Congregação Mariana, pois, desde que entrara no Seminário, não fora aceito! Ele disse ao reitor:
– Padre reitor, se o senhor me permite entrar no caminho do sacerdócio, acho que é possível também aceitar minha candidatura a congregante de Maria. Imagine, padre reitor: desde minha entrada no Seminário até hoje jamais foi aceita minha candidatura. Por quê? Porque, padre reitor, no regulamento de nosso Seminário existem proibições sem sentido. Por exemplo, há corredores enormes que devemos cruzar em silêncio absoluto. Exigir silêncio é muito fácil, muito mais fácil que conseguir que se fale como pessoas humanas que sabem respeitar-se e respeitar as demais. Acaba sendo muito mais fácil impor o silêncio que educar para o diálogo. Mas minha pouca idade não me faz compreender isso. Por isso me rebelo e falo nos corredores. E quando vejo um superior que vem em minha direção continuo falando, parece-me uma questão de honra, de caráter. Evidentemente, isso me vale uma má nota de comportamento que me impede de ser admitido entre os congregantes de Maria. Na sala de estudos também é exigido silêncio! Lá, padre reitor, é proibido consultar ou ajudar o vizinho! Ou seja, estamos aprendendo a nos fechar no egoísmo, no individualismo. É assim que aprendemos a ser sacerdotes? Por isso, também lá me rebelo, falo e consulto meus colegas quando preciso, ou ajudo-os quando sou capaz. E se por acaso um inspetor me olha eu sigo falando, é uma questão de honra. Por isso eu recebo uma nota baixa que se torna um obstáculo para entrar na Congregação Mariana.
O padre reitor lhe disse:
– Meu filho, hoje mesmo você será aceito como congregante….
Mas Helder não se deu por satisfeito:
– Padre reitor, o senhor pensará que é muito o que está me concedendo. Perdoe-me, mas não aceito apenas a minha admissão, há pelo menos dezoito colegas meus exatamente na mesma situação.
E o reitor:
– Todos, se quiserem, serão recebidos amanhã, domingo, na Congregação Mariana.
No dia seguinte, Helder voltou para agradecer e fez um novo pedido:
– Ah, padre reitor, sempre tenho coisas para pedir… Desta vez quero pedir que o senhor faça uma experiência: quem quiser estudar em silêncio, que fique na sala de estudos. Mas em nossa turma há aqueles que precisam de ajuda e outros que entendem mais rápido o que está sendo ensinado, que veem mais longe. Por que não deixar que, enquanto os que preferem o silêncio fiquem na sala chamada Silêncio, os demais possam ir para outra sala? Porque a pessoa que tem maior facilidade, que recebeu esse favor do Senhor, favor que não lhe pertence, deve compartilhá-lo. Acho que meu amigo Luiz Braga pode perfeitamente encarregar-se de ajudar nas disciplinas científicas. E eu poderia me encarregar da filosofia. Depois ele se encarregará da moral, e eu da dogmática.
O reitor não só concordou com o pedido como manteve a experiência, mesmo depois da saída de Helder e Luiz do Seminário.
Dom Helder será um grande defensor da educação, da educação para o diálogo, da democracia, da colegialidade episcopal, da sinodalidade. Entre as suas mais belas e profundas meditações está aquela intitulada “Diálogo”.
Pe. Ivanir Antonio Rampon
Dom Helder Camara. “Diálogo”. In Dom Helder Camara, Um olhar sobre a cidade [CD-ROM]. Recife, sd.
Dom Helder Camara. Le conversioni di un vescovo. Torino: Società Editrice Internazionale. Prefazione di José de Broucker, p. 40-42. [Original Lés conversions d’évêque: Editions Seuil, 1977].
Hélder Câmara. Chi sono io? A cura di Benedicto Tapia de Renedo, presentazione di Ettore Mesina. Assisi: Cittadella Editrice, p. 18, 1979.
Ivanir Antonio Rampon, O caminho espiritual de Dom Helder Camara. São Paulo: Paulinas, p. 27-28, 2013.
José de Broucker. Helder Camara. La violenza di un pacifico. Roma: Edizioni Saggi ed esperienze, Tipografia Città Nuova, p.14-17, 1970.
Nelson Piletti e Walter Praxedes, Dom Hélder Câmara: entre o poder e a profecia. São Paulo: Editora Contexto, p. 73-75, 2008.
Um comentário sobre “Causos do Dom: Seminarista Helder apoia a educação para o diálogo”
Ótimo texto, reflexão…motivação para a vida. Gratidão