Francisco Buarque de Hollanda Celebra 80 Anos
Hoje o compositor, cantor escritor Chico Buarque de Holanda celebra 80 anos de vida.
Dom Helder Camara era um grande fã do Sr. Francisco, como costumava chamar.
Ele escreveu algumas crônicas para o seu programa de rádio Um OIhar sobre a Cidade, falando de músicas de Chico. Em homenagem aos 80 anos do cantor, vamos hoje postar uma dessas crônicas
A lição de Chico Buarque
Quinta-feira, 19.2.1976
Meus queridos amigos
Quem conhece casais desentendidos, ele pra lá, ela pra cá? Os dois se atacam, os dois se acusam, mas lá no íntimo do íntimo, os dois se amam e se esperam… Ah! Se um dia a “Valsinha” de Chico Buarque se tornasse realidade!
“Um dia ele chegou tão diferente
Do seu jeito de sempre chegar.
Olhou-a de um jeito muito mais quente
Do que sempre costumava olhar.
E não maldisse a vida tanto
Quanto era seu jeito de sempre falar.
E nem deixou-a só num canto,
Pra seu grande espanto
Convidou-a pra rodar.
Então ela se fez bonita
Como há muito tempo não queria ousar.
Com seu vestido decotado,
Cheirando a guardado de tanto esperar.
Depois os dois deram-se os braços
Como há muito tempo não se usava dar.
E cheios de ternura e graça
Foram para a praça
E começaram a se abraçar.
E ali dançaram tanta dança
Que a vizinhança toda despertou
E foi tanta felicidade
Que toda a cidade
Se iluminou.
E foram tantos beijos loucos,
Tantos gritos roucos
Como não se ouvia mais,
Que o mundo compreendeu
E o dia amanheceu em paz.”
Tenho praticamente a certeza de que encontro assim só não se dá muito mais, antes de tudo, porque sobra amor próprio de lado a lado. Ninguém quer ser vencido. Ninguém quer dar parte de fraco.
Ninguém quer ceder.
Quem não sabe que para além do amor próprio há amor dormindo, amor pisado, maltratado dos dois lados, mas amor… E quando há amor de lado a lado, por mais que os dois se escondam, há dias, há momentos em que uma chispa dispararia a “Valsinha” de Chico…
Mas aqui surge um grande entrave: fosse só os dois eles já teriam se reencontrado. Mas há os insufladores e insufladoras… Há quem pague para encher os ouvidos dos outros com informaçoes, com notícias, com segredos, sempre para azedar e desunir.
Mandem as favas o amor próprio. Vocês se feriram de lado a lado. Mandem passear os intrigantes e as intrigantes, por mais que se cubram com máscara de amigos. E quando a “Valsinha” rebentar, quando a vizinha estiver acordando feliz, quando a cidade estiver se iluminando, me chamem que eu pago para ver e saudar e aplaudir corações que se reencontram.