Memória em Palavras – Em Texto
A Atualidade de Discursos de Dom Helder Camara
Ao Redor do Mundo – 1970 (I)
Ameaça sobre a Humanidade
A partir de hoje, começamos a postar um pequeno texto retirado dos discursos de Dom Helder, em uma proposta de Geraldo Frencken, que considera que as palavras do Dom, embora pronunciadas no século passado, ecoam em nossos dias e podem nos ajudar a refletir a situação atual na qual se encontra a nossa sociedade.
Quando se observa a Terra …
Descobrem-se facilmente injustiças por toda a parte. Injustiças de diferentes naturezas e em diferentes graus: mas incontestavelmente injustiças.
Nos países subdesenvolvidos, as injustiças – que são talvez ignoradas externamente – atingem milhões de criaturas humanas. De filhos de Deus, reduzindo-os a uma condição de infra-homens.
Que se quer dizer exatamente com: uma situação infra-humana? Não será uma expressão demasiada dura, mascarada de demagogia? Não. Existe muitas vezes o que se poderia chamar uma herança de miséria. Ora quem não sabe que a miséria mata tão eficazmente como a guerra mais sangrenta? Faz mais que matar: conduz a distorções físicas (basta pensar na Biafra), distorções psicológicas (há numerosos casos de atrasados mentais, de que a fome é responsável) e distorções morais (aqueles que devido a uma situação de escravatura, oculta mãos bem real, vivem sem perspectivas e sem esperança, caiem no fatalismo e são reduzidos a uma mentalidade de mendigos).
Mas atenção! As injustiças não são monopólio dos países subdesenvolvidos.
Existem também nos países desenvolvidos, tanto do lado capitalista como do lado socialista.
No mundo capitalista, mesmo nos países mais ricos, há camadas subdesenvolvidas, como o que no Canadá se começa a chamar de ‘zonas cinzentas’……
Se é verdade que as condições infra-humanas nos países desenvolvidos não são exatamente as mesmas que nos países subdesenvolvidos, não é menos verdade, que a diferença entre a pobreza e a riqueza, nos países ricos, cria contrastes chocantes.
…..
Mas as injustiças tomam uma dimensão diferente quando se observa as relações entre países desenvolvidos e país subdesenvolvidos. Por duas vezes, os países subdesenvolvidos tentaram entabular o diálogo com os países desenvolvidos. ….. Mas, de momento, o mundo desenvolvido sente-se suficientemente orgulhoso e seguro de si, com as suas bombas nucleares, ri-se do gigante de pés de barro, que o mundo desenvolvido.
Eis a situação das relações humanas no início do segundo decénio do desenvolvimento. Se o único desenvolvimento verdadeiro supõe o desenvolvimento de todo o homem e de todos os homens, não há, na realidade, um só país verdadeiramente desenvolvido no mundo.
Mas impõe-se uma outra conclusão, muito mais grave ainda, que devemos assinalar pelas suas consequências trágicas, e que é a seguinte: observem-se de perto as injustiças nos países subdesenvolvidos, nos países desenvolvidos, nas relações entre o mundo desenvolvido e o mundo subdesenvolvido. Constatar-se-á que, em toda parte, as injustiças são uma violência. Pode e deve-se dizer que são um toda a parte, a primeira de todas as violências: a violência n.º 1!”
Esse foi o Discurso na abertura da ‘Ação, Justiça e Paz’ para o plano mundial. Recife, 31.1/1.2 1970. Em: DOM HELDER CAMARA, Circulares Ação Justiça e Paz.
Volume V – Tomo I, p.p. 314.315. Editora CEPE, Pernambuco, 2022)
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E, ao final do discurso, Geraldo nos faz uma sugestão para trabalho em grupo. Que tal aproveitarmos a sugestão dele fazermos a reflexão que ele propõe?
Podemos nos interrogar
Quais seriam as ameaças à humanidade hoje,
após 54 anos deste pronunciamento de Dom
Helder?
Qual nossa atitude?
Vamos lá?