Poema da Missa: Desejo e Magia
Meus queridos amigos
Muitos de nossos desejos ficam só para Deus. Por vezes até revelar o que nos passa pela cabeça seria capaz de chocar, de escandalizar.
Quando estou em lojas de brinquedos e vejo crianças loucas de alegria,
de desejo e de inveja diante de brinquedos tentadores até para gente grande, tenho ímpeto de comprar a loja toda e alegrar a criançada
tão querida pelo Mestre.
Quando estou em hospitais e vejo tantos enfermos, sobretudo quando me defronto com sofrimentos mais dolorosos ou com crianças sofrendo,
ou pais e mães de família se acabando
quando teriam uma ninhada e filhos para criar,
sinto como somos covardes ou como é frágil a nossa fé. Não bastaria uma grande fé para mandar
que um monte se atirasse n’água?
Que tentação de mandar às favas a prudência,
de perder o medo do risco e de ordenar, em nome do
Cristo, que os enfermos regressassem para casa, curados!
Quando assisto a mágicos, tenho vontade de tomar aulas com eles.
Se desta idade fico louco de felicidade assistindo a mágicas,
imagine-se a criançada!
Se não me matriculei ainda para ter aulas de mágica
é porque as que eu sonho fazer acho que os mágicos, se sabem, não me ensinam.
Queria tanto a magia de desamarrar carrancas (caras
amarradas),
queria tanto a mágica de transformar não só anéis em
pássaros que saem voando, mas incompreensões em compreensões…
Se conhecerem algum mágico que ensine a espantar tristeza,
mandem o nome, mandem o endereço,
e eu sairei correndo para matricular-me.
Como somos cheios de respeito humano! Como confiamos pouco
na imaginação, no bom humor, na compreensão e na inteligência dos outros!
Até agora só citei desejinhos simples, fáceis de entender
e de aceitar. Vou arriscar um mais difícil de ser entendido, mais louco da loucura de Deus!
Todo dia, quando celebro a missa e, pela força do Espírito Santo,
em lugar de pão e vinho, tenho o corpo e o sangue de Cristo em minhas
mãos, tenho vontade de sair dançando com a hóstia e o cálice na mão…
Sair dançando! Quem quiser me achar louco que ache.
Louco da loucura divina.
É o Filho que se faz Homem e na Eucaristia
toma o lugar do vinho e do pão!
Como sei que uma gota de sangue divino tem virtudes e poder
para lavar todos os crimes da Terra e salvar todas as criaturas,
tenho ímpetos de sair dançando e espargindo, por toda parte, o Sangue
Salvador…
Criaturas espantadas,
irmãos a quem tenha — quem sabe? escandalizado, tranquilizem-se:
minhas loucuras mansas
ficam só no desejo…
Continuarei prudente, comedido,
bem comportado…
Loucura, só por dentro e só com Deus
Recife, quarta-feira, 17/5/1976
Programa “Um olhar sobre a cidade”