Causos do Dom: As formigas e as Plantinhas
Prof. Martinho Condini
Não era segredo para ninguém a admiração de Dom Helder por São Francisco. O santo, por sua radicalidade evangélica de amor aos pobres, sempre o seduziu, desde os tempos do seminário na Prainha, em Fortaleza. Também admirava o amor de Francisco à natureza e grande respeito às criaturas de Deus.
Os animais, as plantas e toda a criação eram motivo de louvor para o Santos de Assis. Quem não recorda o belo Cântico das Criaturas, onde o irmão Francisco louva a irmã água, o irmão sol, a irmã lua, a irmã terra e todas as criaturas de Deus! Um dos biógrafos do Santo Assis, Tomás de Cedano, relata que, aos frades que cortavam lenha, São Francisco proibia arrancar a árvore inteira, “para que tivesse esperança de brotar outra vez”.
Também “recolhia do caminho os vermezinhos, para que não fossem pisados, e mandava dar mel e o melhor vinho às abelhas para não morrerem de frio no inverno”. Tomás de Celano, no capítulo 29 da Vida II, relata, ainda, que São Francisco “sentia alegria diante de flores, vendo sua beleza e sentindo o seu perfume” e que “quando encontrava muitas flores juntas, pregava para elas e as convidava a louvar o senhor como se fossem racionais”.
Dom Helder também viveu à sua maneira um pouco de Francisco, convivendo em harmonia com todas as criaturas de Deus, até mesmo com as simples plantinhas que nasciam na sua calçada, conforme deixou registrado numa das meditações do padre José: “Querem consertar a minha calçada”.
Eu nem reparara
que ela estava quebrada
Acho lindo
o matinho humilde
que ali nasceu.
Como fazer entender
que ele é muito mais belo
e vivo
que o cimento frio,
que os amigos desejam ofertar?
Se o cimento vencer,
será lápide mortuária,
com a inscrição invisível:
“Aqui jaz
o matinho mais vivo,
mais teimoso
e inteligente
de toda a redondeza…”!
Como o Santo de Assis, Dom Helder também tinha uma relação de amor com o seu pequeno jardim. Ao acordar, certo dia, verificou que as formigas estavam estragando tudo, trabalhando como nunca na destruição de suas frágeis plantinhas, que não eram muitas devido ao pouco espaço.
Pensou no que poderia fazer para acabar com aquela “praga” que continuava estragado seu jardim. Comprar algum produto químico para matar as formigas? Jamais! Disso tinha certeza. Afinal, “as formigas também tinham o direito de procurar comida”, dizia aos amigos.
Mas a situação foi ficando cada vez mais feia. As formigas estavam devorando tudo muito rapidamente. Precisava, urgentemente, pensar numa solução para o problema. Então, por que não o seu lado São Francisco?Sentou então no chão e começou a conversar com as formiga1s, pedindo-lhe que não destruíssem seu jardim.Evidentemente sua conversa não surtiu qualquer efeito!Mas Dom Helder ficou muito satisfeito com o seu gesto franciscano. E, as formigas e as plantinhas continuaram “convivendo” no pequeno jardim.
FILHO, Félix. Além das Ideias: histórias de vida de Dom Helder Camara. 1ª reimpressão. Recife. Cepe. 2016. p.74-75.