Causos do Dom: Sugestões ao Santo Padre
Prof. Martinho Condini
Em meados de novembro de 1965, poucos dias antes do solene encerramento do concílio, o papa pede ao bispo brasileiro sugestões para as cerimônias finais. Helder empenha-se com tanto afinco na tarefa de preparar tais “sugestões” que nem tempo para participar da assinatura do Pacto das Catacumbas, do qual foi um dos principais arquitetos, no dia 16 de novembro, com os amigos do Grupo da Pobreza.
Cobertas pelos mais efusivos protestos de atendimento filial ao papa, as Sugestões para o Encerramento do Concílio são, na realidade, uma “obra de malandro”, uma paródia, a expressão irônica do pessimismo otimista vivido por Helder e que dele faz, em Roma, um “bobo da corte”.
Helder propõe ao papa um programa a ser realizado nos últimos sete dias do Concílio (2 a 8 de dezembro de 1965): diálogos, preces e encontros.
No dia 2, um Diálogo do Santo Padre com um grupo de ateus, em homenagem a todos os que têm fome e sede de verdade, na Biblioteca do Vaticano.
No dia seguinte uma Prece ecumênica com os hinduístas na Pinacoteca do Vaticano.
No dia 4, Prece com os budistas no Museu do Vaticano.
No dia 5, um encontro inesquecível, que dê oportunidades excepcionais ao Espírito Santo, e uma Sala dominada pela figura de Abraão ou da Virgem (Helder pensa talvez num encontro com muçulmanos, já que faz alusão à figura de Abraão).
No dia 6, Prece ecumênica com os judeus, na Antiga Sinagoga de Roma, transformada em Igreja católica, ou em Sala dominada pela figura de Moisés.
No dia 7, Vigília Bíblica com os observadores não católicos, na Basílica de São Pedro.
Finalmente, para o dia 8, um pedido (que na realidade é uma sugestão): Santo Padre, daríeis permissão para que, sob Vossa autoridade e convosco, o Concílio canonizasse publicamente, o papa João XXIII, na Praça de São Pedro?
[…] sei que o Santo Padre não vai poder fazer nada disso. Mas sinto necessidade de apresentar-lhe estas sugestões que, no íntimo, ele gostará de receber […].
HOONAERTT, Eduardo. Helder Camara: quando a vida se faz dom. São Paulo, Paulus Editora, 2021. p.160-161-162)