*Foto Casarão – JC Online
Quando a Verdade e a Vida Andam de Mãos Dadas
No dia 1º de junho de 2012, o então governador do estado de Pernambuco, Eduardo Campos, deu posse, no Palácio do Campo das Princesas, aos membros da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Camara, instituída pela Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). Em seu discurso disse que tinha certeza de que a Comissão exerceria um importante papel nos rumos da democracia no país. E disse ainda que: “O seu compromisso essencial é com a verdade, base sobre a qual se fundaram todas as sociedades, nas mais diferentes culturas, que venceram o totalitarismo e o arbítrio. E a verdade é o contrário do esquecimento, é a capacidade de contar o que aconteceu”.
Uma alteração ma Lei nº 16.241, de 14 de dezembro de 2017, criou o Calendário Oficial de Eventos e Datas Comemorativas do Estado de Pernambuco, definindo , fixando e consolidando as Leis que instituíram Eventos e Datas Comemorativas Estaduais, para instituir o ano de 2022 como o Ano da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara. O Projeto que deu origem a essa Lei é de autoria do deputado Isaltino Nascimento.
A Comissão, coordenada pelo Dr. Fernando de Vasconcelos Coelho, tem, entre seus integrantes, o diretor de cultura do IDHeC, o Prof. Manoel Moraes, que fez o discurso de abertura das comemorações do Ano da Comissão, na última quinta-feira, 24 de fevereiro, no Sítio da Trindade
A realização da abertura no Sítio da Trindade, não foi por acaso. Com a presença do governador do Estado, Paulo Câmara, foi assinado o Protocolo de Intenções da Instalação do Memorial da Democracia de Pernambuco, no Sítio Trindade.
O casarão do Sítio da Trindade passará a abrigar o acervo reunido pela Comissão Estadual da Memória e Verdade, além de informações sobre as lutas libertárias ocorridas no Estado durante os anos de Chumbo. Entre os materiais estão documentos, fotos, vídeos e o próprio relatório da comissão.
A partir da Lei que criou a Comissão, foi criado o Memorial da Verdade, uma vez que prévia que, quando do encerramento dos trabalhos da Comissão, em 2017, seria criado o Memorial, para preservação e disponibilização do acervo, dando aos pesquisadores e à população, acesso a esse material.
Para viabilizar a criação do Memorial, foi criado o Grupo de Trabalho “Memorial da Democracia de Pernambuco”, através do Decreto Nº 51.751, de 03 de novembro de 2021, no âmbito do Poder Executivo Estadual, com a finalidade de discutir e definir formas de estruturação do acervo documental produzido pela Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara – CEMVDHC e de concretização das recomendações constantes do relatório final da referida Comissão.
Em seu discurso Manoel Moraes disse que o Memorial “vem em momento oportuno, um momento em que o mundo assiste ao início de uma guerra. Contra a intolerância, contra o totalitarismo, contra qualquer autoritarismo, nós estamos dando um recado: Queremos a paz, a paz que é fruto da justiça. Então que este memorial venha, que ele seja acolhido pela sociedade como instrumento que permita contribuir na luta para que não se repita, para que jamais aconteça esses crimes.”
O Memorial da Democracia ser instalado no Sítio da Trindade, no não é uma mera coincidência. O Arraial do Bom Jesus foi também um ponto importante das guerras coloniais. Ali repousam balas de canhões, que foram atiradas contra pessoas que resistiram por anos. Ao mesmo tempo, partiu de lá a retomada que unificou nosso ancestrais no desejo pela liberdade.
O Prof. Manoel Moraes mencionou o fato “destes valores terem sido retomados na Revolução Pernambucana de 1817 e na Confederação do Equador. Momentos históricos eternizados em nossa bandeira, em nosso hino, em nossos símbolos. Não é coincidência que Paulo Freire e seus amigos educadores e intelectuais escolheram este lugar de resistência para que, na década de 1960, o casarão abrigasse o Movimento de Cultura Popular (MCP)”.
O Memorial é um equipamento educativo, dinâmico e deve ser um ponto de partida para uma política pública de memória, que amplie em outros municípios o conhecimento das gerações futuras sobre a indignidade de uma ditadura militar.
Através dos documentos disponibilizados no Memorial, serão revelados 21 anos de perseguições, repressões e torturas, praticados por ex-agentes dos órgãos de segurança do Estado, contra Pernambucanos aqui e em outros estados do Brasil. Foi a estes Pernambucanos que foi dedicado o relatório final da Comissão.
A expectativa de quem integra a o Grupo de Trabalho, é que o Memorial seja como uma base para vários outros projetos de pesquisa.
Os cadernos, frutos do trabalho da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Camara podem ser acessados no portal da Cepe – Companhia Editora de Pernambuco
Ou no site da própria Comissão.
A finalização do discurso do Prof. Manoel Moraes não poderia ser mais belo e significativo, ao ler T os versos do poeta Thiago Mello: Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente):
Artigo I.
Fica decretado que agora vale a verdade.
que agora vale a vida,
e que de mãos dadas,
trabalharemos todos pela vida verdadeira.
[…]
Artigo Final.
Fica proibido o uso da palavra liberdade.
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.
Santiago do Chile, abril de 1964
Publicado no livro Faz Escuro Mas Eu Canto: Porque a Manhã Vai Chegar (1965).