Causos do Dom: Ou Isto ou Aquilo?

Prof. Martinho Condini

Entre a segunda metade dos anos de 1950 e o início dos anos de 1960, padre Helder (como ele era costumeiramente chamado na cidade do Rio de Janeiro)   liderava a Cruzada São Sebastião. Projeto de desfavelização e construção de um conjunto habitacional na zona sul da cidade do Rio de Janeiro.

Uma das maneiras dele obter recursos para esse grandioso projeto era comparecendo a programas de televisão quando convidado.

Padre Helder certa vez vai a um programa de grande sucesso na TV, no qual o apresentador sorteava uma pessoa da platéia, e essa pessoa era colocada numa cabine fechada. A partir dessa cabine a pessoa não conseguia enxergar nada do que se passava do lado de fora. E o palco, repleto de prendas: carro, televisor, liquidificador, geladeira, relógio, pinça, cortador de unhas… uma porção de objetos.

 Padre Helder, foi incumbido pelo apresentador e o  patrocinador do programa a perguntar ao seo Joaquim (operário sorteado que estava na cabine): “O senhor troca isto por aquilo?”. Seo Joaquim não tinha ideia do que estava sendo proposto, cabia-lhe responder sim ou não. Isso ocorreu sucessivamente umas sete ou oito vezes, até que, cessada a última pergunta, o objeto da última troca era o prêmio recebido.

O auditório, na torcida pelo operário, lamentou quando seu Joaquim deixou de ganhar um carro por preferir, jogando no escuro, um abridor de latas.

O apresentador lamentou ao entregar-lhe o prêmio, e disse:

– O senhor, seu Joaquim teve a oportunidade de ganhar este carro ou aquela geladeira, mas insistiu no abridor de latas.

O apresentador agradece, em nome dos seus patrocinadores, a presença de Dom Helder e entrega um cheque a padre Helder para as obras da Cruzada São Sebastião.

Dom Helder, gênio da comunicação, pediu licença ao apresentador, virou-se para o lado do operário e propôs:

– Seu Joaquim, você troca isto (o cheque) por este abridor?

 E entregou o cheque ao operário! Que saiu feliz da vida do programa.

O auditório aplaudiu fervorosamente a atitude de padre Helder.

No dia seguinte, religiosos próximos de padre Helder comentaram com ele:

– “Mas Padre Helder, o senhor abriu mão do dinheiro da Cruzada, uma contribuição importante! Como vai obter igual valor?”

Ele retrucou:

– “Ah… vocês não têm ideia: o que perdi no cheque, ganhei em publicidade. Maiores recursos virão”.

BETTO, Frei. Dom Helder um jovem de 90 anos, p. 48, in ROCHA, Zildo (org.). Helder, o Dom: uma vida que marcou os rumos da Igreja no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1999.

*  O Prof. Martinho Condini é historiador, mestre em Ciências da Religião e doutor em Educação. Pesquisador da vida e obra de Dom Helder Camara e Paulo Freire. Publicou pela Paulus Editora os livros ‘Dom Helder Camara um modelo de esperança’, ‘Helder Camara, um nordestino cidadão do mundo’, ‘Fundamentos para uma Educação Libertadora: Dom Helder Camara e Paulo Freire’ e o DVD ‘ Educar como Prática da Liberdade: Dom Helder Camara e Paulo Freire. Pela Pablo Editorial publicou o livro ‘Monsenhor Helder Camara um ejemplo de esperanza’. Contato profcondini@gmail.com