Quarta-feira, 19.5.1976
Meus queridos amigos
Muitos de nossos desejos ficam só para Deus. Por vezes até revelar o que nos passa pela cabeça seria capaz de chocar, de escandalizar.
Quando estou em lojas de brinquedos e vejo crianças loucas de alegria, de desejo e de inveja diante de brinquedos tentadores até para gente grande, tenho ímpeto de comprar a loja toda e alegrar a criançada tão querida pelo Mestre.
Quando estou em hospitais e vejo tantos enfermos, sobretudo quando me defronto com sofrimentos mais dolorosos ou com crianças sofrendo, ou pais e mães de família se acabando quando teriam uma ninhada e filhos para criar, sinto como somos covardes ou como é frágil a nossa fé. Não bastaria uma grande fé para mandar que um monte se atirasse n’água? Que tentação de mandar as favas a prudência, de perder o medo do risco e de ordenar, em nome do Cristo, que os enfermos regressassem para casa, curados!
Quando assisto a mágicos tenho vontade de tomar aulas com eles.
Se desta idade fico louco de felicidade assistindo a mágicas, imagine- se a criançada! Se não me matriculei ainda para ter aulas de mágica é porque as que eu sonho fazer acho que os mágicos, se sabem, não me ensinam. Queria tanto a magia de desamarrar carrancas (caras amarradas), queria tanto a mágica de transformar não só anéis em pássaros que saem voando, mas incompreensões em compreensões…
Se conhecerem algum mágico que ensine a espantar tristeza, mandem o nome, mandem o endereço, e eu sairei correndo para matricular-me.
Como somos cheios de respeito humano! Como confiamos pouco na imaginação, no bom humor, na compreensão e na inteligência dos outros! Até agora só citei desenhos simples, fáceis de entender e de aceitar. Vou arriscar um mais difícil de ser entendido, mais louco da loucura de Deus!
Todo dia, quando celebro a missa e, pela força do Espírito Santo, em lugar de pão e vinho, tenho o corpo e o sangue de Cristo em minhas mãos, tenho vontade de sair dançando com a hóstia e o cálice na mão… Sair dançando! Quem quiser me achar louco que ache.
Louco da loucura divina. É o Filho que se faz Homem e na Eucaristia toma o lugar do vinho e do pão!
Como sei que uma gota de sangue divino tem virtudes e poder para lavar todos os crimes da Terra e salvar todas as criaturas, tenho ímpetos de sair dançando e espargindo, por toda parte, o Sangue Salvador… Criaturas espantadas, irmãos a quem tenha — quem sabe? — escandalizado, tranquilizem-se: minhas loucuras mansas O amor não tem medida
Terça-feira, 16.4.1974
Meus queridos amigos
Escutem esta meditaçao que depois procuraremos aprofundar. Caminhar
no amor:
“Mesmo que o ódio, em volta, torne impossíveis os caminhos, o
amor salta abismos, nao se fere em pedras e espinhos… Caminhar
no amor nao será aventura ao mesmo tempo ridícula ou de todo
inútil. O amor nao pensa em exitos, nao exige vitórias, nao pede,
nao mede, nao conta — ama.”
Caminhar no amor. Os namorados costumam dizer ou pensar:
Amar sempre mais, hoje mais do que ontem e menos que amanha.
Caminhar no amor a Deus e ao próximo. Nao parar. Quem para, dá
para trás. É arrastado pelas águas.
Levanta-se a dúvida: Mas amar, mesmo quando se está cercado
de ódio? Amar a quem é bom, amável, leal, amigo, é fácil demais. O
difícil é, no meio da incompreensao, das intrigas, do ódio, nao guardar
nem sombra de ódio no coraçao. A dúvida se torna ainda maior:
mas de que adianta? Amar a quem nos odeia só serve para aumentar
a irritaçao contra nós: parece zombaria.
Deus nao exige que a gente vença, que se tenha a última palavra.
Se tivéssemos o dom de desfazer as intrigas, de fazer o ódio sumir,
de espalhar compreensao, amor e paz, já receberíamos a recompensa
aqui na Terra…
Aliás, o melhor do amor é dar sem pesar, sem medir, sem contar…
Isto de amar apenas a quem nos ama — isto de sair de balança na
mão e quando colocarem num prato da balança 500 gramas, colocar
no outro prato também 500 gramas, é comércio, é o que quiserem.
Só não é amor.
A medida do amor é não ter medida. Caminhemos no amor a
Deus, no amor ao próximo!…ficam só no desejo… Continuarei prudente, comedido, bem comportado…
Loucura, só por dentro e só com Deus!