A partir do próximo domingo, 06 de outubro e até o dia 27, o Vaticano realizará 16ª Assembleia Geral Ordinária – o Sínodo da Amazônia, reunindo 250 bispos de todo o mundo para discutir o tema: “Amazônia, novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.
O evento, que contará com a presença do Papa Francisco, se propõe a ser um momento mais de escuta do que de fala por parte do Vaticano. Na verdade, o seu objetivo é ouvir a opinião dos fiéis sobre assuntos específicos, através de questionários conduzidos pelos bispos participantes e tomar decisões a partir desses consensos.
O Sínodo analisará o material produzido por 13 autores, incluindo três brasileiros, membros da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), dividido em três subtítulos e linhas de ação: “A voz da Amazônia” (Ver), “Ecologia Integral: o clamor da terra e dos pobres (Discernir) e “Igreja Profética na Amazônia: desafios e esperanças (Agir) e servirá de apoio para discutir temas como a riqueza cultural e ecológica da região, mudanças climáticas usadas por desmatamentos, os direitos de quilombolas e a crise migratória da Venezuela.
Um outro ponto que irá ser abordado no Sínodo é a hipótese de a Igreja permitir a ordenação de homens casados na Amazônia, uma vez que é grande a falta de padres na região.
A preocupação com a região Amazônica e com os povos indígenas pela Igreja Católica e, sobretudo de Dom Helder, vem de muito tempo. Como podemos comprovar na crônica escrita por Dom Helder Camara há 39 anos, quando da vinda do Papa Paulo II ao Brasil e que publicamos abaixo.
Quinta-feira, 10.7.1980
Meus queridos amigos
É extraordinário que o Santo Padre João Paulo II, depois de uma viagem pra lá de cansativa, tenha feito questão de ir a Manaus. Claro que não se trata de simples curiosidade de ver a Amazônia, a sua floresta, e suas aves e suas flores. O Papa que, em cada cidade quis ir ao encontro de um problema típico da área, na Amazônia quis ter contato com o que resta dos nossos índios.
O índio tem, em face da natureza, uma posição muito diferente da nossa. Nós estamos convictos de que temos o direito e, praticamente, o dever de dominar a natureza e completar a criação. É terrível o que temos feito na linha de dominar a natureza. Nós a esmagamos, a destruímos e levamos a condições incríveis a poluição.
É de cortar o coração o balanço das florestas destruídas, das riquezas minerais dilapidadas, dos rios, lagos e mares poluídos a ponto de ser impossível ambiente para peixes! O índio em lugar de dominar a natureza e destruí-la prefere conviver com ela. Claro que ele come frutas e animais, mas tudo se passa sem desperdício, sem esbanjamento, na medida exata das necessidades de alimentação.
Amando a natureza, gostando de conviver com ela e tendo, de outra parte, necessidade de liberdade, o índio não se contenta e não se pode contentar, como nós nos contentamos, com uma casa pequena e, quando muito, um pequeno terreno. O índio precisa de espaço para correr, para respirar, para sentir-se livre, para irmanar-se com a natureza.
Claro que nem mesmo os terrenos chamados reduções — reservados para eles — os índios vão poder guardar. Hoje qualquer pedaço de terra, vale mais do que ouro — vale sangue. Quem tem seus projetos de crescimento, por que irá admitir que os índios guardem um espaço relativamente amplo e relativamente não aproveitável, segundo nossa visão de progresso?
E aí estão, sempre mais numerosos e sangrentos, os choques com os índios. Ninguém se lembra de que quando chegaram aqui, com Pedro Álvares Cabral, os chamados descobridores, o Brasil estava mais que descoberto.
Comparados os índios de hoje com os que haviam na chamada descoberta, é mais do que claro que eles estão sendo extintos.
Compreendo, Santo Padre, o vosso desejo de ir a Manaus e de falar sobre os índios. Sois pastor universal; tendes que pensar em todos os filhos, mas, sobretudo, nos mais necessitados e sofredores.
Acertastes de cheio; aqui como em toda parte, se os índios não forem socorridos com inteligencia, amor e espírito de fé, acabarão sendo extintos.