Sábado, 19.5.1979
Meus queridos amigos
Estamos no mês que se abre com o Dia do Trabalho. Entre as comemorações numerosas que houve em todo o País, uma das mais felizes foi, sem dúvida, a que, no Rio de Janeiro, foi promovida pelo Cardeal Dom Eugênio Sales. Dom Eugênio, que tantas vezes é apresentado de maneira bastante injusta, como tipo perfeito de conservador, como quadrado, como careta, sabe assumir, na hora exata, posições corajosas que o levam tranquilamente, sem bravatas, a enfrentar governos e poderosos.
Para comemorar o 1º de Maio no Rio de Janeiro ele determinou que, em todas as igrejas e capelas do Rio de Janeiro, a Santa Missa fosse celebrada, no Dia do Trabalho, pela multidão dos desempregados ou dos subempregados.
Durante a Segunda Guerra Mundial, enquanto a Alemanha de Hitler liderou a guerra e arrasou as cidades inglesas, inclusive Londres, com as tristemente célebres bombas voadoras, os que amam a liberdade admiraram a coragem com que o velho Churchill jamais tentou enganar o povo inglês. Churchill, com seu inseparável charuto, sabia como ninguém que a Inglaterra não precisava de mentiras.
Quando confiaremos bastante em nosso querido Brasil para saber que ele não precisa de nossas inverdades? Minha admiração pela Fundação Getúlio Vargas está abalada à espera de que alguém me prove (o que tanto me alegraria) que ela não capitulou, não desrespeitou seu alto nível científico, concordando em manipular dados sobre a inflação, nos dias da falsa euforia sobre o “milagre econômico brasileiro”.
Quando as autoridades denunciam o que chamam de elitismo das reivindicações dos poderosos sindicatos da região do ABC paulista, conseguem impressionar ingênuos que não se lembram de exigir que, na hora da verdade, se é para falar em elitismo, não se deixe na sombra o elitismo-mor, elitismo ponto de partida de muitos dos nossos males, a terrível discriminação de renda entre brasileiros, já denunciada, pelo menos duas vezes, pelo Banco Mundial.
Houve tempo em que muito muro ganhou um slogan, que era tradução malfeita de slogan que então corria nos Estados Unidos: “Brasil, ame-o ou deixe-o”. Seria bom que não nos muros, mas em nossas consciências, gravássemos esta verdade importantíssima: O Brasil não precisa de nossas mentiras. O Brasil tem energia bastante e bastante fibra para suportar a verdade, por mais grave que ela seja.