O dia 07 de fevereiro poderia ser um dia como outro qualquer em nosso calendário. Em alguns anos seria um dia da semana pré-carnavalesca, em outros poderia ser até mesmo um dos dias do carnaval e, em outros, passaria despercebido, como tantos outros dias do ano passam, sem marcas ou lembranças.
Mas desde 1909 o dia 07 de fevereiro ficou diferente, ficou importante, ficou sendo lembrado, celebrado, comemorado, até hoje, 109 anos depois. E, claro, não poderia ser de outra forma. Afinal foi o dia em que nasceu o profeta do século XX, Dom Helder Camara. Durante os 90 anos em que esteve entre nós, vivia o seu dia com emoção e alegria. E no dia 7 de fevereiro de 1999 viu com satisfação os blocos que se apresentaram no pátio da igreja das Fronteiras ao final da concelebração eucarística em ação de graças por sua vida.
Celebrar o dia em que Dom Helder nasceu não é uma obrigação cívica ou religiosa. É um ato de gratidão e alegria. Gratidão por tudo o que ele nos ensinou e nos deixou e alegria por sua vida, uma vida plena de amor e evangelho.
E o dia 7 de fevereiro de 2018 não poderia acontecer de outra maneira a não ser com uma homenagem celebrando a vida de nosso grande pastor.
O IDHeC – Instituto Dom Helder Camara, o Fórum Articulação de Leigos e Leigas da Arquidiocese de Olinda e Recife e o Fórum Dom Helder Camara, se uniram para organizar uma homenagem onde o pensamento de Dom Helder fosse expressado pelo próprio Dom Helder, uma concelebração Eucarística e, sendo em uma quarta-feira da semana pré-carnavalesca, um encerramento do jeito que o Dom gostava, com carnaval.
Infelizmente alguns problemas de ordem técnica impediram que um equipamentos funcionassem a contento e a primeira parte acontecesse, que seria a exibição de vídeos de Dom Helder lendo algumas crônicas escritas para o seu programa Um Olhar sobre a Cidade, uma pequena amostra da Sinfonia dos Dois mundos, encerrando com Mariama.
Mas nenhum contratempo poderia diminuir a alegria de estarmos todos ali, reunidos, para celebrar a vida do DOM. E assim foi feito.
A concelebração Eucarística foi presidida pelo monge beneditino Marcelo Barros e concelebrada pelo capelão das Fronteiras, Pe. José Augusto e pelo administrador paroquial da matriz de Casa Forte Pe. Deyvson Soares dos Santos e contou com a participação do diácono Carlos Beethoven Lisboa Melo, representante da Igreja Ortodoxa.
As orações dos fiéis foram baseadas em palavras de Dom Helder e do papa Francisco e pediam para rezarmos por uma Igreja em Saída, pobre, servidora e libertadora, fiel ao projeto de Reino anunciado por Jesus Cristo, e liberta de todo clericalismo rico em dinheiro ou em soberba, como profetizava Dom Helder e anuncia o Papa Francisco, rezemos ao Senhor, entre outras coisas.
O canto animado por Valmir e Heloísa animou a celebração levando os presentes a acompanhar cada música e a cantar junto.
A homilia foi feita pelo monge Marcelo Barros que falou sobre a atuação, o posicionamento de Dom Helder diante das violações dos Direitos Humanios.
“Dom Helder lutou pelos direitos humanos. No entanto, ele sabia que a lei pode proibir de matar, pode proibir de discriminar, pode proibir de explorar, mas não pode obrigar ninguém a amar.
A lei que diz \”ame o próximo\” não é uma lei jurídica. É uma orientação de pai, de mãe, de educador. É uma orientação de vida.
Se hoje, nesse momento do nosso país, Dom Helder chegasse aqui agora e pudesse falar, o que ele pediria a nós, o que ele nos proporia?
Ele se somaria à voz de todos os movimentos sociais para denunciar a perda dos direitos dos trabalhadores. Ele se somaria à voz de todos os verdadeiros juristas do mundo inteiro para denunciar a iniquidade de tribunais que julgam por indícios e não por provas comprovadas. Ele se somaria à voz da CNBB que na Campanha da Fraternidade desse ano está retomando a proposta de Dom Helder para que haja no Brasil não somente Comissões de Justiça e Paz, mas também uma Ação coletiva e permanente de Justiça e Paz, um trabalho pela não violência ativa”.
Marcelo Barros finalizou sua homilia com um poema de Dom Helder sobre a pomba da paz:
“Preciso levar aos homens o ramo de oliveira que o Senhor Deus me confiou!
Por enquanto não há lugar nenhum onde pousar: as grandes águas se espalham a perder de vista…
Por enquanto serão trucidadas as mãos que tentarem segurar meu ramo…
Voarei a qualquer preço…
Enquanto eu não cair de cansaço.
Enquanto não for morta, voarei, voarei, voarei…
O Senhor-Deus que me confiou esta missão divina.
Ele me protegerá”!
Após a partilha da eucaristia, o diretor executivo do IDHeC, Antônio Carlos Aguiar leu uma das crônicas do programa Um Olhar sobre a Cidade, O Bolo não foi Dividido que, em seu último trecho diz: ” Pode haver paz se as injustiças só fazem crescer? Não vão na onda de quem diz que primeiro é preciso preparar o bolo, para depois dividi-lo… O bolo já está preparado e está sendo comido. Sem querer de modo algum pregar ódio ou violência, permitam mais um conselho irmão, nesta hora em que há tanta gente na miséria e na fome, procurem saber, mais de perto e mais de dentro, o que anda acontecendo no mundo das mordomias!…”
Foi com muita emoção que os presentes, que lotavam a igreja de ponta a ponta, começaram a ouvir a voz de Dom Helder recitando Mariama, saindo timidamente de um celular, mas ecoando por toda a igreja. Oração feita por Dom Helder na Missa dos Quilombos continua atual, como o são cada palavra dita ou escrita pelo Dom: “Pede ao teu filho que esta festa não termine aqui, a marcha final vai ser linda de viver.
Mas é importante, Mariama, que a Igreja de teu Filho não fique em palavra, não fique em aplauso. (…)
Claro que dirão, Mariama, que é política, que é subversão, que é comunismo. É Evangelho de Cristo, Mariama.(…)
Nada de escravo de hoje ser senhor de escravo de amanhã. Basta de escravos. Um mundo sem senhor e sem escravos. Um mundo de irmãos. De irmãos não só de nome e de mentira. De irmãos de verdade, Mariama”.
No final da missa o Pe. Zé Augusto recordou outros poemas de Dom Helder. A ir. Vanda leu um poema que Pe. João Pubben escreveu para o Dom e Marieta Borges leu sua homenagem pela passagem dos 109 anos do nascimento de Dom Helder.
Fátima, do Movimento de Cursilhos recitou o poema Nossa Senhora do Frevo, uma homenagem do Dom ao carnaval.
O bloco Artesãos da Boa Vista entrou na igreja e puxou os presentes para encerrarem a homenagem dançando no pátio da igreja ao som de uma banda de pau e corda.
Foi o que podemos chamar de uma noite memorável, do jeito que o Dom gostava, com a celebração eucarística e o carnaval ao final.
Foi um noite de partilha não apenas da Eucaristia, mas do trabalho dos que organizaram o momento, da colaboração de todos que participaram, de emoções e de alegrias. Em meio à comemoração lá no céu, com certeza Dom Helder deve ter dado uma paradinha para dar uma espiada na comemoração aqui na terra. E deve ter dado um daqueles seus enormes sorrisos ao ver que o seu legado está sendo preservado e levado adiante por todos e todas que acreditam que um mundo melhor e mais justo é possível.