O DOM E EU:DOM HELDER CAMARA E O CONCÍLIO VATICANO II

 
Por Pe. José Oscar Beozzo
 

José Oscar Beozzo (foto) é padre, teólogo e coordenador geral do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular – Cesep. Tem mestrado em Sociologia da Religião, pela Université Catholique de Louvain, Bélgica, e doutorado em História Social, pela Universidade de São Paulo – USP. Faz parte do Centro de Estudos de História da Igreja na América Latina –CEHILA/Brasil, filiado à Comissão de Estudos de História da Igreja na América Latina e no Caribe – CEHILA. Também é sócio-fundador da Agência de Informação Frei Tito para a América Latina – Adital. É autor de inúmeros livros, entre os quais A Igreja do Brasil (Petrópolis: Vozes, 1993) e A Igreja do Brasil no Concílio Vaticano II: 1959-1965 (São Paulo: Paulinas, 2005)

 
DOM HELDER CAMARA E O CONCÍLIO VATICANO II
 
INTRODUÇÃO
 
O Concílio Vaticano II (1962-1965), desde seu anúncio pelo Papa João XXIII, a 25 de janeiro de 1959, provocou profundo entusiasmo em Dom Helder Camara[1], acendendo em sua mente, incontáveis sonhos e projetos acerca de uma igreja mais evangélica e ecumênica, mais próxima dos pobres, empenhada no desenvolvimento dos povos e na sua mútua compreensão, capaz de propiciar um diálogo entre o norte e o sul do mundo, de colaborar na promoção da paz e da cooperação internacional, interlocutora dos meios de comunicação social e da cultura moderna.
O entusiasmo inicial foi, porém, mitigado pelas inumeráveis dificuldades do período preparatório, pelo pesado manto de segredo oficial que cobriu os trabalhos desta fase, fazendo com que os próprios bispos se sentissem à margem de tudo, até às vésperas do grande evento.
 
Dom Helder, como consultor da Comissão dos Bispos e Governo das Dioceses foi um dos sete bispos, entre os dez brasileiros, que tomaram parte numa das dez comissões preparatórias ou num dos quatro Secretariados do Concílio, criados em 5 de junho de 1960. Mas mesmo estes bispos estavam escassamente informados, pois desconheciam o andamento das outras comissões que trabalhavam paralelamente umas às outras, sem comunicação entre si, e encaminhando seus resultados apenas para a Comissão Central.
 
Dom Helder, às vésperas do Concílio, está inquieto e confia ao fiel amigo Manoelito, Dom Manuel Larrain, bispo de Talca no Chile, suas apreensões e mesmo desalento:
        “Vejo o Concílio aproximar-se. Até hoje, nem sequer o Temário nos chegou. Humanamente, não há muito como esperar […] Mesmo assim, irei ao Concílio. Será a suprema oportunidade, porque o Santo Padre nos mandou falar como Bispos. Na medida em que o pudermos fazer, faremos. De julho para cá, a situação só tem piorado. O Temário do Concílio, até hoje não chegou ao Brasil”. [2]
 
1.   DOM HELDER,  ATOR CONCILIAR
 
Uma vez em Roma, a alocução do Papa João XXIII de abertura ao Concílio, a Gaudet Mater Ecclesia – Alegra-se a Mãe Igreja,  na manhã do dia 11 de outubro de 1962,  devolveu-lhe novamente a esperança e o entusiasmo.
 
Dois dias depois, em sua primeira Congregação Geral, a 13 de outubro, os trabalhos conciliares apenas iniciados, foram suspensos dez minutos depois, por intervenção do Cardeal Achille Liénart, secundado pelo Cardeal J. Frings, arcebispo de Colônia na Alemanha, falando igualmente em nome do Cardeal Julius Döpfner de Munique e do Cardeal Franz König de Viena, na Aústria, que se recusavam a votar a lista dos integrantes das Comissões conciliares, sem uma consulta prévia entre os membros do Concílio[3]. Diante da perplexidade geral, o Secretário do Concílio, o Arcebispo Pericle Felici consultou o Conselho de Presidência e o Cardeal Eugène Tisserrant que presidia a sessão suspendeu os trabalhos por quatro dias.
 
A imprensa captou a transcendência desse gesto da Assembléia que aplaudiu as intervenções, deixando transparecer nos títulos das manchetes sua interpretação do evento: “Terminou o predomínio da Cúria Romana”; “A Rebelião dos Bispos”; “A Ala Renovadora impõe uma Lista Internacional”; “Os Bispos europeus rejeitam os candidatos de Ottaviani”; “Luta feroz entre duas tendências” e assim por diante[4]. De fato, saia de cena a Cúria Romana, cujos prefeitos haviam presidido cada uma das Comissões Preparatórias do Concílio e ocupavam o cenário novos atores, os episcopados recém-chegados a Roma e, de modo particular, as Conferências Episcopais e o único organismo de caráter continental em toda a Igreja, o Conselho Episcopal Latino-americano, o CELAM.
 
Dom Helder, secretário da Conferência Episcopal brasileira, a CNBB e vice-presidente do CELAM, lançou-se, de corpo e alma, junto com Dom Manoel Larrain, seu colega na vice-presidência do CELAM, nos esforço de articulação com as demais conferências episcopais, para comporem a nova lista de nomes para as Comissões Conciliares, em substituição às Comissões da fase preparatória que a Secretaria Geral do Concílio, queria ver transformadas nas Comissões permanentes do próprio Concílio. Isto perpetuaria o controle que a Cúria Romana havia exercido sobre toda a etapa de preparação do Concilio.
 
Começava ali a singular aventura do “Dom”, como era carinhosamente chamado pelos amigos,  durante os quatro anos do Concílio Vaticano II (1962 a 1965) que o transformariam, do relativamente pouco conhecido arcebispo auxiliar do Rio de Janeiro, num dos personagens mais influentes na cena internacional da igreja contemporânea.
 
2. DOM HELDER, UM DOS ARTICULADORES DO CONCÍLIO
E O REGISTRO DE SUA AÇÃO NUM SINGULAR “DIÁRIO”: AS CARTAS CONCILIARES
 
Do Concílio, legou-nos Dom Helder, uma espécie de diário íntimo, consignado em 297 cartas escritas, quase diariamente, durante as quatro sessões do Concílio e durante a inter-sessão de 1963/64.
Destas, sete que foram escritas durante a primeira sessão conciliar em 1962, encontram-se perdidas. Os originais das demais estão depositados atualmente na Fundação “Obras de Frei Francisco”, no Recife.
Estas cartas foram dirigidas a um pequeno grupo de colaboradores e principalmente colaboradoras do Rio de Janeiro e depois do Recife, que Dom Helder chama de “família do São Joaquim”[5], “família de Mecejana[6]” ou ainda “família mecejanense e olindo-recifense[7]”. O Concílio Vaticano II foi, para Dom Helder, a ocasião para ingressar numa série de articulações internacionais e grupos de trabalho, muitos das quais por ele sugeridos e animados, ganhando a partir daí uma plataforma de ação de raio cada vez mais amplo.[8]
 
 Dom Helder não chegou, porém, ao Concílio de mãos vazias. Sua atuação como Assistente Nacional da Ação Católica Brasileira e de todos os seus ramos especializados, colocara-o em contato estreito com o laicato, dera-lhe uma visão geral do Brasil e de sua igreja, com seus valores e problemas, por vezes, dramáticos; o havia inserido na rede latino-americano e internacional estabelecida pela Ação Católica. Esta o levaria, como assistente eclesiástico da delegação brasileira de leigos da Ação Católica, à sua primeira viagem a Roma, durante o Ano Santo de 1950, por ocasião do I Congresso Internacional dos Leigos.
 
Ali, encontrara-se com o Papa Pio XII que o encaminhara ao seu  sub-secretário de Estado, Mons. Giovanni Baptista Montini, o futuro Papa Paulo VI, a quem submeteu, nesta e na viagem seguinte, em 1951, sua proposta de criação de uma Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
Nasceu entre esses dois homens de Igreja, mútua confiança e amizade que possibilitarão a Dom Helder dirigir-se, muitas vezes, durante o Concílio, diretamente ao Cardeal Montini e depois ao Papa Paulo VI, confiando-lhe sugestões e expondo-lhe temores e esperanças.
Veio Dom Helder ao Concílio, não como um bispo isolado, mas como secretário geral, há exatos dez anos (1952-1962) da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a terceira conferência mais numerosa do mundo todo, só suplantada pela italiana e a norte-americana.
 
Chegava também no quadro do único continente que contava com um organismo de articulação, a América Latina onde, desde 1955, fora fundado o CELAM, Conselho Episcopal Latino-americano, do qual Dom Helder era um dos dois vice-presidentes, sendo o outro Dom Manuel Larraín do Chile. Este  será eleito, logo no ano seguinte, seu presidente (1963-1966). Dom Helder tinha profunda consciência de que a CNBB e o CELAM eram suas “plataformas” de ação e articulação, como deixa claramente consignado em carta de 1963, ao ser eleito Dom Larrain,  presidente do CELAM e, ele mesmo, reconduzido à primeira vice-presidência (1963-1965):
 
“Houve eleição no CELAM. A América Latina inteira quis como presidente o querido Manoelito (Mons. Larraín) e elegeu o Dom[9]para 1 º Vice. Há o consolo de ver que a dupla fraterna não está sem cobertura. A posse, se Deus quiser, será amanhã, na presença do Cardeal Confalonieri e de Mons. Samoré… Telegrafamos ao Santo Padre comunicando a eleição e pedindo a benção… A eleição facilita o trabalho do Ecumênico. Se eu saísse da CNBB e do CELAM (é claro que eu já aceitara a oferenda), em rigor perderia a base para atuar nas reuniões de 6 ª feira [as reuniões do Ecumênico]”.[10]
Da sua formação no Seminário da Prainha, em Fortaleza, havia herdado o domínio da língua francesa. Esta fora-lhe transmitida pelos padres lazaristas franceses, ao lado do latim, instrumentos que, durante o Concílio, lhe foram essenciais, junto com seu inglês meio periclitante, para seus contatos com os outros padres conciliares, mas também com jornalistas e a televisão.
A imediata cooperação nascida entre Dom Helder e o Pe. Miguel (pseudônimo em suas cartas conciliares, para Leo Joseph Suenens, o cardeal arcebispo de Malinas-Bruxelas, membro da Comissão de Assuntos Extraordinários na primeira sessão conciliar, da Comissão de Coordenação criada ao final da primeira sessão, um dos quatro  moderadores que passaram a presidir as Congregações Gerais, a partir do início da segunda sessão e, certamente, um dos mais influentes padres conciliares), assim como com  o secretário do Episcopado francês, Roger Etchegaray, permitiu a Dom Helder fazer parte do grupo seleto dos que podiam exercer alguma influência sobre a imensa e heterogênea massa dos padres conciliares.
 
3. UMA ATUAÇÃO CONCERTADA VIA GRUPOS INFORMAIS:
O “ECUMÊNICO”, “A IGREJA DOS POBRES”, O “OPUS ANGELI”.
 
Gostaria de destacar, finalmente, alguns dos grupos dos quais participou Dom Helder, ampliando seu raio de ação e influência durante o Concílio.
 
3.1.     O ECUMÊNICO
À raiz da bem sucedida experiência da primeira semana no Concilio, para a constituição da lista de nomes para as comissões conciliares, surgiu a idéia da formação de um grupo de trabalho informal que reunisse representantes das principais conferências episcopais, com vistas a intercambiar informações e pontos de vista, estabelecer uma coordenação entre si, a proporem iniciativas e a agilizarem o próprio andamento do Concílio. A iniciativa ficou conhecida como “Grupo da Domus Mariae[11], do nome do local, onde se reuniam os bispos; “Grupo da Terça-feira”, mesmo que, posteriormente, suas reuniões acontecessem na Sexta-feira; “Interconferência” devido ao fato de congregarem representantes de conferências nacionais ou regionais (África, Ásia e América Latina); “Grupo dos 22”, do número inicial das conferências, embora estas já fossem cerca de 30 na quarta sessão (1965) e ainda o “ECUMÊNICO”, como gostava de chamá-lo Dom Helder.
 
Na pesquisa de Caporale, um jornalista norte-americano que tenta levantar, durante a segunda sessão (1963), as figuras mais influentes do Concílio, Dom Helder surge no grupo das dezoito personalidades de proa e o grupo da Domus Mariae, como o mais significativo:
 
“[…] pudemos identificar quatro grupos informais de bispos que se encontram regularmente em diversos lugares […] De longe, o mais importante e eclético destes grupos informais foi o organizado pelos bispos brasileiros na Domus Mariae… entre os animadores deste grupo que se reunia regularmente, cada sexta-feira, estava o arcebispo Helder Câmara”.[12]
Neste intercâmbio entre conferências episcopais, Dom Helder carregava uma preocupação mais entranhada, a de abrir espaço para um verdadeiro diálogo e cooperação entre o norte e o sul do mundo, entre desenvolvidos e sub-desenvolvidos. Para isto, moveu céus e terras, primeiro para atrair os episcopados da África e da Ásia e, depois, para conseguir espaços institucionais para a temática do terceiro mundo como no caso do seu apelo insistente ao Cardeal Suenens, para que ajudasse a patrocinar a criação, junto à Comissão de Assuntos Extraordinários do Concílio, de um “Secretariado especial para as questões da Pobreza e do Terceiro Mundo”.[13]
Não esconde seu entusiasmo, depois da conferência que convocara para o “diálogo dos dois mundos”:
 
“19:30 do dia 29 (29-11-1962). Houve o início do diálogo entre os Dois Mundos. Foi emocionante. Ali, estava na presidência, o sucessor e Mercier[14], que se mostrou absolutamente à altura da missão que a Providência lhe confia… Ali estava um resumo altamente representativo do Mundo sub-desenvolvido e do Mundo desenvolvido. O Pe. Houtart[15]correspondeu de todo às nossas esperanças. Abri o diálogo de que participaram interessadíssimos os dois Mundos. Mas grande mesmo foi Suenens ao encerrar o encontro. Disse verdades fortes e de maneira admirável.”[16]
 
3.2.      A IGREJA DOS POBRES
 
O outro grupo que ajudou a criar, ao qual foi fiel até o fim e onde se sentia espiritual e humanamente em casa, foi o da “IGREJA DOS POBRES”. Na primeira sessão de 1962, havia juntamente com ele, outros oito brasileiros que se converteriam em 16 na terceira sessão, num total de 86 padres conciliares. Estava inspirado no itinerário de Paul Gauthier que escrevera, a partir de sua experiência de operário em Nazaré, o livro “Jesus, a Igreja e os Pobres”. Acompanhava-o Marie-Therèse Lescase, religiosa carmelita egressa que fora igualmente viver pobremente em Nazaré. Gauthier conseguiu sensibilizar um grupo importante de bispos e peritos, entre os quais o Pe. Yves Congar O.P. que escrevera um texto provocativo e profundo como proposta eclesial: “Pour une Église servante et pauvre”, “Por uma Igreja servidora e pobre”. Ao grupo, juntaram-se bispos que estavam próximos da espiritualidade dos Irmãos e Irmãzinhas de Charles de Foucauld, dos padres operários, da Missão da França e bispos que vinham do terceiro mundo, angustiados com a miséria das grandes maiorias e preocupados em encontrar saídas para sua pobreza e desamparo.
 
Dom Antônio Fragoso, bispo emérito de Crateús, deixou-nos um depoimento sobre o grupo que se reunia no Colégio Belga:
 
“O grupo começou na primeira sessão. Tínhamos como secretários Paul Gauthier e Marie-Therèse Lescase. O tema era a Igreja e os Pobres, começando pela identidade entre Jesus e os pobres. Lembro-me do argumento central: quando afirmamos a identidade entre Jesus e o pão consagrado: ‘isto é meu corpo’, nós [o] adoramos e tiramos conseqüências para nossa espiritualidade, liturgia e tudo o mais. Quando [se] afirma a identidade entre ele e os que não tem pão, casa, nós não tiramos as conseqüências para a espiritualidade, liturgia, ação pastoral. Lembro-me de que, na sessão final, fomos celebrar, numa das Catacumbas, a eucaristia final. Assinamos um compromisso nosso com os pobres: dar uma atenção prioritária aos pobres (não ter dinheiro em banco, patrimônio),  e este compromisso chegou a ser assinado por 500 bispos”.
Mas o mesmo Dom Fragoso constatava com uma ponta de tristeza:
“[O Concílio] permitiu-me descobrir que os pobres não estavam no coração e no horizonte dos bispos. Por isto, o Concílio não deu maior atenção ao tema. O Concílio permitiu-me sair daquele pessimismo sobre a natureza e dar-me alegria, mas não o vi se reconciliando com os pobres”.[17]
Pode-se reconhecer que o grupo não alcançou o que esperava institucionalmente do Concílio, mas teve uma profunda repercussão espiritual e profética, espelhada no Pacto das Catacumbas, onde estão arrolados os compromissos que assumiam os seus signatários, na sua vida quotidiana e no seu trabalho pastoral, em relação aos pobres e à uma vida pessoal de pobreza. [18]
Com Helder, consciente de que o Concílio não respondera, nem mesmo com a Gaudium et Spes, às necessidades e expectativas do Terceiro Mundo, arrancara de Paulo VI, a promessa de uma encíclica que tratasse do “desenvolvimento dos povos”, que se concretizou na divulgação da Populorum Progressio, em 1967.
Consciente também de que o sonho de João XXIII de uma “Igreja dos Pobres” não conseguira empolgar o Concílio, lutará para que, na América Latina, esta se tornasse a questão eclesial mais importante. De fato, em 1968,  na II Conferência Geral do Episcopado Latino-americano, o documento 14, consagrado à eclesiologia, terá como título e conteúdo “Pobreza na Igreja”.[19] 
 
3.3.      O OPUS ANGELI
 
Outro feito decisivo de D. Helder Camara no Concílio foi conseguir que os melhores teólogos e peritos ali presentes começassem a trabalhar em conjunto e em estreita colaboração com os bispos reunidos no “Ecumênico” e na “Igreja dos Pobres”. Esse mesmo grupo de teólogos prestou inestimável serviço aos bispos do Brasil, por meio das conferências da Domus Mariae, que na soma das três últimas sessões alcançaram o respeitável número de 84, às quais devem ser acrescentadas outras dez da primeira sessão[20]. A essa força tarefa, já esboçada entre Dom Helder, Larrain e o Pe. François Houtart[21]de Lovaina na Bélgica que desempenhou o papel de seu secretário, foi dado o nome de “OPUS ANGELI”, a Obra dos Anjos. Esta trabalhou durante as sessões mas também nas inter-sessões, no sentido de oferecer textos alternativos aos esquemas provindos da etapa preparatória do Concílio, de preparar intervenções para serem lidas na aula conciliar, de assessorar os bispos nas questões mais complexas, de elaborar “modos” substitutivos para determinadas passagens dos esquemas submetidos a votação. Um dos teólogos mais importantes deste século, o Pe. Yves Congar e que colaborou estreitamente com Dom Helder e com os grupos por ele animados, tornando-se um pouco o coordenador do “Opus Angeli”, percebeu logo no primeiro encontro entre ambos, a importância de Dom Helder e de sua liderança que aportava ao Concílio algo mais que faltava aos outros: uma “visão”, no sentido do visionário, daquele que enxerga longe e com largueza de vistas. Congar anota no seu diário a 21 de outubro de 1962:
 
“Puis arrive Helder Câmara, secretaire du CELAM[22]. C’est extraordinaire: aujourd’hui même, à midi, ils ont parlé de moi et ont dit qu’il faudrait me faire venir. Après avoir bavardé un bon moment, nous allons dans une salle, où se réunissent avec nous une douzaine de jeunes évêques. Ils m’interrogent. Mgr. Helder même: un homme non seulement très ouvert, mas plein d’idées, d’imagination et d’enthousiasme. Il a ce qui manque à Rome: la ‘vision’[23].
Dias depois, em circular à sua “família” de colaboradores no Rio de Janeiro, Dom Helder comentando sobre as pessoas que mais o haviam impressionado como homens de Deus em Roma, chega ao teólogo dominicano:
“- o Pe. Yves Congar, cuja visão da Igreja, cujo ecumenismo, cuja caridade e cuja cultura extraordinária, brilham ainda mais pela humildade que ele encarna.[24]
 
 
4. AULA CONCILIAR x  TRIBUNA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
 
Dom Helder, finalmente, alcançara um agudo senso de que, mais do que as palavras e documentos, o que realmente chegava às pessoas e as tocava, eram determinados gestos e símbolos, e que era pelas imagens que se fixava no povo o sentido do Concílio.
 
Estava sempre em busca destes gestos que pudessem causar impacto. Ao Papa João XXIII, havia proposto uma celebração final que abandonasse o fasto barroco da Roma pontifícia e primasse pela simplicidade e profundidade dos gestos. Repete a mesma proposta ao Papa Paulo VI e exulta quando alguns destes sinais são por ele incorporados à celebração de encerramento do Concílio.
 
Possuía clara consciência de que o Concílio operava em várias plataformas distintas:
                           os debates durante as Congregações Gerais e, para tanto, empenhava-se, via Ecumênico, Igreja dos Pobres, CNBB, CELAM, que chegassem à Aula Conciliar intervenções vigorosas e norteadoras para os trabalhos conciliares, de preferência intervenções coletivas e que apontavam para um amplo consenso prévio;
                           nas Comissões de Trabalho onde os textos eram elaborados, refeitos e limados para serem submetidos à votação e foi ali operoso, dando sua contribuição sucessivamente nas Comissões dos Bispos e Governo das Dioceses, na do Apostolado dos Leigos e na do Esquema XIII, convertido na Gaudium et Spes;
                           na conversão dos corações e das mentes e, neste particular, cuidou para que o episcopado, tanto brasileiro como o latino-americano, estivessem em contato com as correntes espirituais e teológicas que moviam o Concílio. O melhor exemplo deste empenho foram as Conferências da Domus Mariae, em número de 94, ao longo das quatro sessões conciliares, promovidas pelo Episcopado brasileiro e o ciclo de conferências organizado pelo CELAM, embora em menor número e sem o caráter sistemático e a mesma repercussão alcançada pelas da Domus Mariae[25].
 
Ainda que não tenha falado nenhuma vez na Aula Conciliar, Dom Helder preparou algumas intervenções notáveis depositadas por escrito na Secretaria Geral. Nelas transparece claramente sua preocupação com os rumos do Concílio, com seu método de trabalho. Deixa patente em todas elas sua visão de caráter mais abrangente e estratégico frente aos grandes problemas contemporâneos e às responsabilidades e missão da Igreja[26].
 
4.1. O “VOTUM” E AS INTERVENÇÕES POR ESCRITO DE DOM HELDER
 
        Logo que o Secretário de Estado, Cardeal Domenico Tardini, escreveu a 18 de junho de 1959, em nome de João XXIII, a todos os bispos e prelados do orbe católico, solicitando suas sugestões para a agenda conciliar, Helder Camara aprestou-se a enviar sua resposta, com data de 15 de agosto de 1959[27]
 
        Trata-se de um texto conciso de duas páginas e meia, mas que difere extraordinariamente do estilo de respostas enviadas pela maioria do episcopado mundial.
 
        Em primeiro lugar, Dom Helder expressa-se com liberdade e ousadia, propondo logo de início que o latim não seja a única língua do Concílio, pois fora do círculo estreito da Cúria e das Universidades Romanas o idioma de Virgílio não era mais de uso corrente. Afirma que dentre os bispos do Brasil apenas uns 5% seriam capazes de se expressar com fluência, oralmente ou por escrito, em latim e que o panorama não deveria ser muito diverso em outras partes do mundo. 
 
        Inquieta-se com a mole imensa de propostas que certamente chegariam às mãos dos encarregados da preparação do Concílio e com um bom método para navegar neste grande mar de temas e problemas. Adianta a sugestão de que várias  comissões se ocupassem dos distintos problemas e sob o título de “Por uma situação mais feliz do mundo”, propõe que a matéria conciliar fosse agrupada em seis grandes áreas: economia, artes (belas artes), ciências, política, questões sociais e, finalmente, religiosas.
 
        Sua preocupação maior entretanto é com o enfoque das questões. Para ele, o que deve presidir a reflexão e a ação dos padres conciliares é a situação dos povos e pessoas menos cultos, refletindo a mesma preocupação do bispo Agostinho, quando escrevia o seu De cathechisandibus  rudibus.
 
Enquanto muitos falam do conflito entre as grandes potências do Oriente e do Ocidente no quadro da guerra fria, Dom Helder propõe que o Concílio volte sua atenção para os 2/3 da humanidade que estão submergidos na fome e na miséria. Pergunta-se qual a força que poderia vir em socorro desta humanidade sofredora e desamparada: o cristianismo ou o comunismo? Pensa que na América Latina, a Igreja, por intermédio do CELAM, poderia ter uma atuação mais eficaz do que a própria Operação Pan-americana proposta pelos chefes de Estado do continente, para ir de encontro aos seus problemas. Propõe que as igrejas situadas nos países mais ricos do hemisfério (Canadá e Estados Unidos) se empenhassem numa ação conjunta com os demais países da América e do Caribe para superar a grave situação do continente. Pensa entretanto que a mesma preocupação devia estender-se aos povos empobrecidos da Ásia e da África, pelas mesmas razões positivas que levaram a Igreja, no passado, a se dirigir aos pagãos e aos bárbaros, e não simplesmente para se opor ao comunismo.
 
        Por conta de suas funções no CELAM expressa ainda o seu compromisso de dedicar-se, de corpo e alma, para melhorar situação de todos os povos da América Latina e do Caribe, compreendidos dentro do raio de ação do Conselho.
 
        Esse respiro amplo, que ultrapassa os limites da Arquidiocese do Rio de Janeiro, onde era arcebispo auxiliar (1952-1964), ou da Arquidiocese de Olinda e Recife da qual se tornou arcebispo em 1964; os limites do Brasil de cuja conferência episcopal era o secretário geral; os limites da América Latina, de cujo principal organismo eclesial, o CELAM, era um dos vice-presidentes, dilata-se em direção às outras regiões do Terceiro Mundo e à humanidade em seu todo. O seu votum já anuncia, em estado nascente mas com firme convicção, o norte que guiará a sua atuação no Concílio, o da mesma paixão que animava o apóstolo Paulo, a sollicitudo omnium ecclesiaram, a “solicitude por todas as Igrejas”.
 
        Dentre as dez intervenções por escrito de Dom Helder, selecionamos algumas que estão voltadas para os rumos gerais do Concílio.
 
        Em 21 de novembro de 1962, quando chegava ao fim o I período conciliar e que a Assembléia buscava afanosamente definir a pauta dos trabalhos e encontrar um eixo orientador para o Concílio, Dom Helder, soma-se  a outros doze bispos da Europa, Oriente Médio, África, Ásia e América Latina[28], para solicitar a João XXIII que, imediatamente depois da discussão sobre a Igreja, Lumen Gentium, o Concílio se voltasse para as grandes questões que afligem a humanidade e que poderiam ser agrupadas em quatro vertentes principais:
a)   Problemas relativos ao exercício da justiça e da caridade fraterna, tanto pessoal quanto social, principalmente em relação aos povos em vias de desenvolvimento. Os subscritores evocam a preocupação de João XXIII, expressa na sua alocução radiofônica pronunciada um mês antes da abertura do Concílio: “La Chiesa se presenta quale è, e vuole essere, come la Chiesa di tutti, e particularmente la Chiesa dei poveri”[29].
 
b)  Problemas relativos à paz e à união de todos os povos que formam a grande família humana, insistindo não só na superação dos conflitos armados mas nas exigências positivas da paz[30].
 
c)   Evangelização dos pobres e dos que se encontram longe da Igreja[31].
 
d)  Exigências de renovação evangélica tanto nos pastores como nos fieis da Igreja, com especial atenção aos conselhos evangélicos e à pobreza que não pode limitar-se a palavras e discursos[32].
 
Os subscritores pedem finalmente que seja constituída uma Comissão ou Secretariado especial para lidar com essas questões, ainda antes do fim da primeira sessão conciliar, como sinal de que a Igreja está firmemente comprometida a enfrentar, de maneira séria e eficaz, os problemas do mundo moderno, empenhando-se em sua superação[33]. Este Secretariado não foi criado naquele momento, mas logo depois do Concílio, Paulo VI instituiu a Pontifícia Comissão Justiça e Paz, voltada toda ela para cumprir os objetivos esboçados na proposta de Dom Helder em 1962.
 
Trata-se a nosso ver da primeira iniciativa concreta que irá desembocar na elaboração do esquema XVII, convertido em esquema XIII e por fim na Constituição Pastoral Gaudium et Spes e no seu posterior complemento, a encíclica Populorum Progressiode Paulo VI.
 
Outra intervenção, encabeçada por Dom Helder Câmara, redigida em francês e subscrita por representantes de 23 conferências episcopais, pede ao Papa Paulo VI que, tendo em conta a crucial relevância do esquema sobre a “Igreja no Mundo de Hoje” e a dificuldade em aprofunda-lo no decorrer do exíguo tempo que restava da III sessão conciliar, previsse um novo período conciliar para o ano seguinte, em 1965[34].
 
        Numa intervenção semelhante redigida em inglês, provavelmente no mesmo dia e subscrita por praticamente os mesmos bispos, pede-se que o Concílio centre sua atenção nos problemas da pobreza no mundo e empenhe-se na formação da consciência dos cristãos nos países mais ricos. Pede-se ademais que seja um leigo, perito no tema, que exponha aos bispos, na Aula Conciliar, o estado da questão do mundo; que se forme uma comissão de especialistas que delineie o tipo de instituições, as formas de cooperação, de contatos e de políticas que a Igreja pode adotar para assegurar sua plena participação num ataque em escala mundial para a erradicação da pobreza[35].
 
4.2. ATUAÇÃO VOLTADA PARA A OPINIÃO PÚBLICA
 
Se Dom Helder empenhou-se com todas suas forças para atuar em todas as instâncias da máquina conciliar, tinha por outro lado clareza, de que o Concílio que chegava realmente à opinião pública, era aquele filtrado pelos jornalistas e transmitido ao mundo, a cada dia, pela imprensa escrita, falada e televisiva.
Por isso, o mesmo Dom Helder, que se aplicava a articular a ação dos bispos e peritos, a coordenar as conferências episcopais, mas que nunca interveio na Aula Conciliar, era pródigo em atender à solicitação dos jornalistas para entrevistas, programas de televisão e conferências de imprensa. Via a imprensa não apenas como instrumento para transmitir, de modo compreensível, o que se passava no Concílio, mas igualmente como veículo para lançar novas idéias e para exercer indiretamente pressão sobre a Assembléia Conciliar, fazendo chegar recados às mais altas autoridades da Igreja, interpelando intelectuais e governantes, entusiasmando jovens e formadores de opinião. Preparava acuradamente suas conferências e sermões, submetendo o rascunho de suas idéias e intuições à família Mecejanense, a peritos do Concílio, a técnicos e economistas amigos e mesmo à Secretaria de Estado e até mesmo ao Papa, quando abordava temas delicados.
Valha como exemplo dessa complexa avaliação que Dom Helder fazia do papel dos meios de comunicação e da importância da opinião pública, o que escreve, logo depois de uma sua concorridíssima conferência em Roma sobre “Perspectivas de novas estruturas na Igreja”, com o auditório cheio de teólogos e dos observadores não católicos:
 
“Em que dará minha palestra? Haverá forte reação da extrema direita? A Cúria Romana reagirá?
Que pensará a respeito o Santo Padre?
Agi tranqüilamente. Deus sabe que, nem por sombra, se trata da vaidade de ter intuições, de pensar que sou mesmo profeta.
Agi e agirei e agiria:
     por estar convicto de que meu papel no Concílio é o de agir no Ecumênico e de falar extra-Basílica (talvez, um dia, também falarei na Basílica);
     pela necessidade de ajudar o Santo Padre (um risco e uma loucura como os de ontem, com repercussão na imprensa, em última análise, ajudam o Papa);
     pela necessidade de encorajar os Peritos, os observadores e a imprensa;
     pela necessidade de ajudar toda a geração de amanhã (jovens clérigos e leigos, ansiosos por ver a super-prudência contrabalançada por uma ponta de audácia);
     pela convicção de ter recebido o sopro de Deus, através de José[36]…”[37]
 
O falar franco e direto, crítico e esperançoso de Dom Helder encantava os jornalistas que o assediavam para entrevistas e reportagens.
 
Sua grande tribuna no Concílio, não foi a Aula Conciliar na Basílica de São Pedro, mas sim a imprensa de uma parte e, de outra,  o incansável esforço de articulação cumprido por meio da CNBB, do CELAM, do Opus Angeli, do Ecumênico, do Grupo da Igreja dos Pobres, da rede de amigos e colaboradores que soube conquistar para suas causas, a dos pobres e a da  Igreja servidora dos pobres, aliado ao trabalho escondido nos bastidores, por intermédio de encontros pessoais, cartas, circulares.
 
Para todo este imenso trabalho, valia-se sempre da oração contemplativa e do fiel grupo de amigas e amigos, provindos de seu tempo de Ação Católica que, no Rio de Janeiro, no Recife e em outras partes do mundo, lhe serviam de retaguarda, sustento e apoio.
 
Pe. José Oscar Beozzo
 

 


[1]Dom Helder Pessoa Câmara, bispo e depois arcebispo auxiliar do Rio de Janeiro (1952-1964) e, em seguida arcebispos de Olinda e Recife (1964-1985),  nasceu no Ceará em 1909, completou noventa anos a 7 de fevereiro de 1999, falecendo a 27 de agosto deste mesmo ano. Foi vice-assistente nacional da Ação Católica Brasileira e o fundador, em 1952, da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), seu secretário geral de 1952 a 1964.Teve destacada atuação no Concílio Vaticano II (1962-1965). Jornalista, conferencista, escritor e poeta exerceu profunda influência na vida cultural, social e religiosa do país, com irradiação no continente latino-americano e também na Europa e na América do Norte.
[2]Carta de D.  Helder Câmara a D.  Manuel Larrain, agosto 1962, Arquivo da CNBB – Secretaria Geral
[3]Para a crônica desta primeira congregação geral decisiva para a marcha posterior do Concílio e do impacto que causou, cfr. CAPRILE, Giovanni, Il Concilio Vaticano II. Il Primo período: 1962-1963. Roma: Civiltà Cattolica, 1968, pp. 20-24; KLOPPENBURG, Boaventura, Concílio Vaticano II – Vol. II. Primeira sessão (Set.-Dez. 1962).Petrópolis: Vozes, 1963, pp. 77-79.
[4]KLOPPENBURG, o.cit. p. 78
[5] O Palácio São Joaquim, residência do Cardeal do Rio de Janeiro, abrigava também as modestas salas onde funcionava a CNBB, desde o Congresso Eucarístico Internacional do Rio de Janeiro. A CNBB foi de lá desalojada pelo Cardeal Dom Jaime de Barros Câmara, depois do golpe militar de 31 de março de 1964 e a ida de Dom Helder Camara para o Recife, PE. Passou para uma sede própria, a Vila Venturosa, no bairro da Glória, em 1964.
[6]Mecejana era um bairro aprazível da cidade de Fortaleza, no Ceará, onde havia nascido Dom Helder Camara.
[7]Depois que toma posse como Arcebispo de Olinda e Recife em abril de 1964, Dom Helder acrescenta aos  destinatários do Rio de Janeiro, seus novos colabores na arquidiocese pernambucana.
[8]cfr. MARQUES, Luiz C. L., “Um tesouro ainda escondido”, in O POVO – Personalidades do Século, , Fortaleza, 07-02-99, p. 5
[9] O “Dom”, era a maneira simples e familiar, como era chamado e conhecido Dom Helder.
[10]  Circular 51/63, 25/26 de novembro de 1963
[11] A Domus Mariae, uma ampla casa de tijolos à vista, situada em meio a um parque na Via Aurélia 480, era a sede da Ação Católica Italiana Feminina e hospedou durante o Vaticano II, o episcopado brasileiro, juntamente com o da Hungria e de alguns outros países da África.
[12] CAPORALE, R., Vatican II: Les Hommes du Concile. Étude sociologique sur Vatican II, Paris, 1965, p. 88. Citado por MARQUES, o.cit., 51. Sobre o Grupo, cfr. ainda J. GROOTAERS, Une forme de concértation épiscopale au Concile Vatican II – “La Conférence des Vingt-Deux” (1962-1965), in “Revue d’Histoire Ecclésiastique”91 (1966), pp. 66-112; P. C. Noël, Gli incontri delle conferenze episcopali durante il concilio. Il “Gruppo dela Domus Mariae”, in FATTORI, Maria Teresa e A. MELLONI, L’Evento e le Decisioni – Studi sulle dinamiche del Concilio Vaticano II, Il Mulino, Bologna, 1997, pp. 95-133; “Le travail post-conciliaire. Les attentes du groupe de la Domus Mariae et l’organisation du l’après Concile”, pp. 1-28, relação apresentada no Colóquio “Vatican II, au but”, Strasbourg, 11-13 de março de 1999 (datilografado).
[13]Rascunho de carta ao arcebispo de Malinas-Bruxelas, Cardeal Leo Joseph Suenens, datado de 23 novembro de 1962 e anexado à sua Circular 39/62 de 19/20 novembro de 1962.
[14]Desiré Mercier (1851-1926), antigo professor de filosofia da Universidade de Lovaina, na Bélgica, um dos animadores da renovação filosófica e teológica do neo-tomismo, em diálogo com as ciências e a filosofia modernas, foi Cardeal Arcebispo de Malinas-Bruxelas, antecessor do Cardeal Leo Joseph Suenens, nesta prestigiosa sede cardinalícia,  e um dos responsáveis pela retomada do diálogo entre católicos e anglicanos, nas célebres “Conversações de Malinas”.
[15]François Houtart, professor de sociologia da religião na Universidade de Lovaina, um dos fundadores do FERES, órgão articulador dos institutos e centros de pesquisas sócio-religiosas da Europa e América Latina, tornou-se o secretário do Opus Angeli, a articulação dos teólogos progressistas do Concílio. O Opus colocou-se a serviço do episcopado brasileiro e também dos episcopados de outros países da América Latina e, de modo especial, do CELAM.
[16]Circular 46/62, 28/29 de novembro de 1962.
[17]Entrevista de Dom Antônio Fragoso ao autor em Ibiúna, a 23-10-1996
[18]KLOPPENBURG, Concílio Vaticano II – 4 ª Sessão (1965) V, 1996, 526-528
[19]CELAM, II  Conferência Geral do Episcopado Latino-americano, A Igreja na atual transformação da América Latina à luz do Concílio, Petrópolis, 1969, Doc. 14, pp. 145-149
[20] Sobre as Conferências da Domus Mariae, cfr. BEOZZO, José Oscar, A Igreja do Brasil no Concílio Vaticano II; 1959-1965. São Paulo: Paulinas, 2005, pp. 195-209.
[21]  A 23 de setembro de 1999, recebi do Pe. Hourtart, alguns comentários sobre o presente texto:
Querido José Oscar,
Gracias por tu carta y por el texto sobre Don Helder. Es realmente excelente. Me ha traído muchos recuerdos, especialmente del concilio, donde he trabajado con él casi diariamente en lo que el llamaba el Opus Angeli. Siempre me recuerdo también que es gracias a él que he podido organizar el estudio socio religioso de América latina entre 1958 y 1962 y finalmente hacer una síntesis para todos los obispos del concilio en francés, inglés y castellano. Cuando llegué a Rio de Janeiro para una primera reunión de coordinación de los que iban a trabajar en este estudio que duró 4 años, él me aviso que la santa sede había escrito a todos los nuncios para avisarles de cuidarse frente a toda encuesta de sociología religiosa. Don Helder, inteligente como siempre me ha dicho: yo tengo una solución. El me pidió, en tanto que secretario de la Conferencia Episcopal, de hacer el trabajo para la conferencia. De esta manera, no había ninguna posibilidad de interferencia de Roma. Eso fue una luz para todo el trabajo y en todos los países latinoamericanos he propuesto a las conferencias episcopales de hacer un trabajo para ellos y eso fue aceptado prácticamente en todas partes. Es realmente el que salvo esta operación, que si no, habría sido extremamente difícil.
Gracias por haber enviado tu texto y muy cordial saludo.
F. HOUTART
François Houtart
CETRI
houtart@espo.ucl.ac.be
[22]Há aqui evidentemente um engano de Congar. Dom Helder era sim secretário mas da CNBB e vice-presidente do CELAM.
[23] Y.-M. CONGAR, Mon Journal du Concile, p. 87, citado por MARQUES, o. cit. 50, nota 6. Segue a tradução do autor do original de Congar: “Chega, em seguida, Helder Câmara, secretário do CELAM. Coisa extraordinária: hoje mesmo, ao meio dia, falaram de mim, dizendo que era preciso que me fizessem vir. Depois de ter conversado durante um bom tempo, fomos para uma sala, onde se reuniram conosco uns doze bispos jovens. Eles me interrogam. Dom Helder também: um homem não somente muito aberto, mas cheio de idéias, de imaginação, de entusiasmo. Ele tem o que falta em Roma: a ‘visão’ ”.
[24]Circular 15/62, 29 de outubro de 1962.
[25]Apenas dois bispos latino-americanos estiveram entre os preletores das Conferências da Domus Mariae, sendo um deles justamente Dom Sérgio Mendez Arceo, bispo de Cuernava, no México que falou no dia 16 de setembro de 1965, sobre o tema: “Aspectos do Celibato Eclesiástico”, seguido por Mons. Ramón Argaña Bogarin, Bispo de San Juan Bautista de las Misiones no Paraguai, no dia 6 de outubro de 1965. Falou ainda o casal mexicano, auditores do Concílio, José e Luz Alvarez Icaza, presidentes do Secretariado para a América Latina do Movimento Familiar Cristão (MFC), cujo tema foi “Investigaciones sobre la actitud de la familia ante el Concilio”, no dia 29 de outubro de 1965. As conferências foram também um espaço importante para a tomada de consciência sobre o tema do ecumenismo e para o encontro pessoal entre os bispos e teólogos, monges e autoridades eclesiásticas vindas da ortodoxia ou do protestantismo. Estiveram entre os conferencistas, alguns deles, várias vezes seguidas, como o Pastor Roger Schutz e o teólogo Max Thurian da Comunidade de Taizé na França, Oscar Cullman, o conhecido biblista e teólogo reformado suíço; Andrej Scrima, enviado pessoal de Athenagoras do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla.
[26] As intervenções de Dom Helder, em número de dez, encontram-se nos seguintes volumes das Atas Sinodais: AS VI/1 (Periodus I – 1962), 294-98; ASVI/1 (Periodus I – 1962), 298-99; AS II/5, 150-52; ASIII/5, 509-10; AS III/7, 941-43; AS III/8, 1039-42; ASIV/2, 893-901; AS IV/III, 860-61; AS IV/3, 350-53; ASIV/3, 496-99
[27] ADA II/7, p. 325-327
[28]Os bispos que subscrevem a petição são, além de Helder Camara, foram C.M. Himmer, N. Edelby, Manuel Larrain, Alfred Ancel, Iulius Angerhausen, Laurentius Satoshi Nagae, Philippe Nguyen-Kim-Dien, Alessandro Olalia, Marcos Mc Grath, Thomas Cooray, Raphael Moralejos, Bernardo Yago, Georgius Mercier. 
[29]AS VI/1, p. 295
[30]ibidem, p. 296
[31]ibidem, p. 296
[32]ibidem, p. 297
[33]ibidem, p. 298
[34]AS III/5, pp. 508-509
[35]AS III/5, pp. 509-510
[36]“José”, era o nome que Dom Helder dava ao seu anjo da guarda e às vezes a si próprio quando estava inspirado.
[37]Circular 76/63, 18/19 de novembro de 1963
 
 

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